Agora que não há orações hebraicas, na Sinagoga Paradesi, em Mattancherry, nem resta, em todo o bairro, nenhuma outra sinagoga, ou um judeu residente, persiste a memória da culinária dos judeus de Cochim, expressa num livro de receitas judaicas locais, compiladas por Sassoon, Kenny Salem e Bala Menon, publicado em 2013.
Em menos de uma década, este livro deixou de ser, especificamente, um livro de cozinha e passou a ser um livro rememorativo da identidade alimentar de uma comunidade desaparecida, portanto um receituário que, dificilmente, terá continuidade e uso diários.
Sem o trabalho e empenho, dos autores, em registarem e comunicarem os saberes e características da cozinha judaica de Cochim, este património identitário e imaterial, à semelhança da comunidade que lhe deu origem, estaria irremediavelmente perdido -a desaparecida comunidade hindu-judaica de Mattancherry- que criou, constituiu, e fez evoluir uma cozinha, a partir da reflexão cuidadosa dos seus princípios religiosos e dos produtos alimentares existentes no contexto geográfico e comercial da sua cidade.
Foi a abundante disponibilidade de especiarias frescas (cardamomo, canela, cominhos, pimenta) e aromáticas (coentros, por exemplo) bem como o leite de coco e o amido de tapioca, que permitiram que as famílias hindu-judaicas, se adaptassem facilmente aos preceitos religiosos alimentares a que estavam obrigadas, por meio da criação de uma culinária kosher com um cariz tropical e único.
Os autores separaram as receitas em dezassete categorias. Cada grupo de receitas possui comentários ou notas de rodapé ocasionais, que fornecem interessantes informações adicionais sobre os judeus de Cochim e a sua história e os seus costumes.
Salientam-se as receitas para a execução dos pastéis de Cochim (crocantes, doces ou salgados) ou do bolo judaico de especiarias, considerados, à época da recolha, por muitos, as receitas mais apreciadas e as mais identitárias da culinária especifica da comunidade judaica de Mattancherry.
O último capítulo corresponde a um guia útil para as especiarias e as complementares massalas (especiarias combinadas, em proporções exatas) mais utilizadas.
Um livro a ler, tendo em atenção que a alimentação, que nos descreve, foi um dos marcadores simbólicos da identidade da comunidade judaica de Cochim, aquele que mais a diferenciava, dos seus vizinhos hinduístas, muçulmanos e cristãos, pelo resultado final produzido com os mesmos produtos alimentares.
ROTA ÍNDIA DO SUL - EM BUSCA DE CRISTÃOS E ESPECIARIA